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Não adianta. Estar em sites de redes sociais é uma exposição. Por mais que tente adotar a estratégia de publicar um criterioso volume de conteúdo, com frequência baixa e com as devidas configurações do Facebook, blindando a pessoa a ser marcado em fotos ou comentário, não interessa. Despudoradamente, nessas mídias há uma exposição e, ao mesmo tempo, segundo a lúcida autora Paula Sibília, no ser humano evidencia-se uma necessidade narcísica de estar no centro das atenções, em um contínuo “show do eu” que tem a intimidade e a obscenidade do cotidiano como seus maiores espetáculos.
Nas redes sociais, por meio de performances individuais, pode-se
modelar e modular diversas identidades de quem se desejar ser e como pretende ser percebido. O ponto é que, como já citado pelo autor deste texto, há uma exposição. E como outras pessoas vão absorver, decodificar, digerir e reagir diante de um conteúdo qualquer é um fator que foge absolutamente de nosso controle.
Nesse sentido, por exemplo, há o recém-lançado site “Namoro Fake”, que cria uma namorada de mentira apenas para o Facebook. Gastando-se apenas uma quantia de R$ 10, pode-se contratar uma “ficante”, ou seja: é criado um perfil fake que vai deixar três comentários ou posts no seu mural. Já contratar uma ex-namorada sai um pouco mais caro. E o perfil de “namorada” logicamente é mais caro ainda. Para facilitar, o pagamento pode ser feito pela ferramenta PagSeguro e dividido em até 12 vezes no cartão de crédito.
Outro exemplo no mínimo interessante são sites ancorados em uma certa forma de eternidade que a web torna possível. Pelo menos, essa é a promessa que o site DeadSocial faz a seus usuários. Essa rede social propõe que se enviem mensagens de texto, imagens ou vídeos; e, também, que se recebam todos esses tipos de materiais provenientes de outras pessoas. Nada de muito novo até aqui, não fosse o fato de que a ideia neste caso é que tudo isso aconteça após a morte dos respectivos emissores. DeadSocial permite que qualquer um programe mensagens para o Facebook. Essas mensagens são ativadas logo depois que o usuário morre e podem ser enviadas por anos. A DeadSocial oferece a seus usuários uma promessa de eternidade.
Na era do espetáculo e do culto ao corpo, gostaria de trazer para à nossa inquieta reflexão a atriz-social Gabriela Pugliesi, dona do blog www.tips4life.com.br e que tem feito relativo sucesso por meio de seu perfil no aplicativo de fotos Instagram. A blogueira está arrebanhando uma legião de seguidoras (sim, a maioria são mulheres, logicamente) por conta de uma estratégia de fotos e textos baseada no oferecimento de um profícuo cardápio que visa a aumentar a “qualidade de vida”. No momento em que este despretensioso texto foi escrito, Gabi estava com mais de 30 mil seguidores. E nas legendas das narcísicas fotos publicadas no Instagram evidencia-se nas entrelinhas um discurso norteado por um feroz julgamento que aponta indiretamente para aquelas usuárias que sucumbem no esforço de se enquadrar sob as coordenadas da boa forma.
Especialmente no Brasil, é relativamente compreensível o sucesso do site da moça pois, de acordo com as pesquisas da antropóloga Mirian Goldenberg, o corpo humano se apresenta como “um verdadeiro capital físico, simbólico, econômico e social”. Nesse sentido, mesmo tendo à sua disposição um poderoso arsenal, fornecido aparentemente de forma gratuita por marcas de roupas e alimentos funcionais, Pugliesi apresenta o tempo todo técnicas e dicas de como cultuar os corpos humanos desencantados de suas potências simbólicas para além de uma simples boa aparência. E tudo com uma retórica especializada em garantir as mais desvairadas certezas. Inevitavelmente, cria-se nas suas seguidoras uma auto-intensa vigilância.
O fato é que o ecossistema digital que habitamos hoje é um solo fértil. De lá, brotam ideias, inovações, insights e novos formatos de se comunicar. E a explosão das mídias digitais provoca fenômenos que potencializam a bel-prazer as mais diversas estratégias de se tentar construir a tão almejada reputação, vis-à-vis os três exemplos que citados nesse texto.
Marcos Hiller é Coordenador do MBA em Marketing, Consumo e Mídia Online da Trevisan Escola de Negócios, e do curso de Mídias Digitais da Escola São Paulo.
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