quinta-feira, outubro 05, 2017

Vamos parar de chamar malvadeza de barbárie?

Imagem: Divulgação
O uso de termos equivocados no dia a dia só contribuem para dificultar o entendimento dos fatos.
Todo dia o Brasil e o mundo produzem dezenas de fatos chocantes para os quais não encontramos explicações  aparentes e imediatas.


Diante de uma tragédia humanitária, de um atentado terrorista, das crueldades que emergem de guerras, de massacres executados por indivíduos, grupos políticos ou religiosos; de uma rebelião de presos; uma ação espetacular de bandidos; ou mesmo um trivial assalto seguido de morte no subúrbio,  a reação de quase todas as pessoas é a mesma.


"Uma barbaridade" é o que mais frequentemente se diz.


O adjetivo externa indignação  ou perplexidade mas em nada ajuda a explicar os acontecimentos. E muito menos a interpretar os motivos reais que se escondem por trás das aparências.


Ao invés de nos aproximar do entendimento, ajuda a nos remeter para um mundo de sombras, onde nada que nos atormenta parece fazer sentido.

Barbaridade ou barbárie é uma expressão milenar. tão duradoura quanto equivocada.


"Bárbaro", no mundo antigo, era aquele que não falava grego ou latim e cuja língua parecia aos ouvidos "cultos" algo como o balbuciar de uma criança. Ou seja, povos que viviam além das fronteiras do Império. Ou, simplesmente, estrangeiros.


Depois de séculos sendo submetidos ao domínio do Império Romano, com seus territórios invadidos, suas aldeias incendiadas, suas riquezas roubadas, suas populações exterminadas ou escravizadas, os Bárbaros deram o troco.


Rebelaram-se e, aproveitando a decadência do Império, devolveram na mesma moeda aos seus opressores.


Saquearam  a própria cidade de Roma seguidas vezes.
Quando os romanos massacravam os homens e estupravam as mulheres dos que viviam fora de suas fronteiras, impondo a paz dos cemitérios, isso era considerado como "civilização".


Quando os oprimidos fizeram o mesmo, isso passou a ser tratado como "barbárie".


Este artigo não pretende ser parte do chato policiamento dito "politicamente correto".


Sua motivação é que quando alguém classifica um ato como "barbaridade", além de expressar e reforçar um arraigado preconceito, nada de positivo está acrescentando.


Adjetivar desse modo só contribui para que todos os acontecimentos inconvenientes e incômodos permaneçam nessa condição nebulosa. Chocantes porém incompreendidos. Sem explicações, logo facilmente rotulados de absurdo e seus incontáveis sinônimos.


Partes do quebra-cabeças de um quotidiano que acaba parecendo como simplesmente um pesadelo.


Desse modo, o obscurantismo se sobrepõe ao entendimento.


E em plena época do mais intenso desenvolvimento tecnológico que a sociedade jamais conheceu; na era da informação globalizada; no tempo da interação democrática e sem fronteiras das redes sociais, o ser humano, usa muito mal a linguagem, o seu mais precioso instrumento de comunicação. Assim, permanece cada vez mais desconectado da sua própria realidade.


Banir termos equivocados das análises não resolve mas pode ser um primeiro passo.

José Nivaldo Junior
Publicitário. Historiador.
Da Academia Pernambucana de Letras

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